Crítica: Os Segredos do Castelo

Existem duas maneiras completamente distintas de se assistir a uma produção (seja filme ou série) baseada em um livro: já conhecendo a obra literária – e podendo reconhecer detalhes importantes – ou sem nenhum conhecimento prévio, moldando sua percepção sobre o resultado da adaptação através do que se vê em tela.

No caso de “Os Segredos do Castelo” (We have always lived in the Castle), embora soubesse que o longa tem como base o livro homônimo de Shirley Jackson, adentrei na história sem mais nenhuma informação. O que é provável que tenha contribuído para a manutenção do meu interesse nesse suspense dramático que chega diretamente às plataformas digitais.

A trama se passa quase em sua totalidade dentro do tal castelo do título, onde moram as irmãs Blackwood, Constance (Alexandra Daddario) e a caçula Mary Katherine (Taissa Farmiga), cuja alcunha “Merricat” prevalecerá por todo o filme. Junto a elas também vive seu enigmático tio Julian (Crispin Glover).

O que aconteceu no passado desse trio é que servirá de estrutura para que a história seja contada através da narração de Merricat. Seis anos atrás, a mais velha das irmãs foi acusada (e posteriormente absolvida) do envenenamento que levou seus pais à morte e que quase vitimou seu tio – que agora ostenta sequelas dessa mal sucedida tentativa de assassinato.

Até que ponto Constance é de fato inocente é algo que não será esclarecido de imediato, com o roteiro escrito por Mark Kruger criando uma espiral crescente de dúvida em cima de suas estranhas ações.

Ainda que as coisas não estejam favoráveis a seu redor – incluindo a crescente e quase unânime animosidade da vila em que as irmãs residem – ela está sempre com um sorriso no rosto e um ar de absoluta placidez, beirando o lunatismo. E acredite: muitas vezes isso é tão ou mais assustador do que um personagem com explosões de raiva ou caráter já definido desde o começo da narrativa.

A meticulosa e entediante rotina de Constance e Merricat é tirada do prumo com a inesperada chegada de Charles (Sebastian Stan), um primo distante, cujos interesses parecem mais suspeitos a cada momento. Provando a velha máxima que afirma que a beleza está nos olhos de quem a vê, a mesma figura provoca sentimentos opostos nas protagonistas, ganhando a total simpatia de uma, enquanto vira alvo de desconfiança da outra.

Com os fatos contados ao longo de pouco mais de uma semana, não há muito tempo a se perder e alguns elementos são mostrados em um ritmo que talvez pudesse ser diferente. O ato final do suspense ganha uma agilidade que, embora possa ser explicada, acaba destoando um pouco do ritmo imposto na maior parte da exibição. Ainda assim, consegue explicar satisfatoriamente pontos importantes que não poderiam ser deixados em aberto.

Dois pontos a serem destacados: Passada em 1960, a trama é bem posicionada nesta época histórica, através de um ótimo trabalho cenográfico, que inclui figurinos e penteados que remetem à tal década com exatidão. Assim como a opção por centralizar a ação dentro das paredes do castelo ajuda o espectador a compreender a extensão do poder exercido pelo local em seus moradores, desde sempre, e valida uma frase dita em dado momento do filme: “O mundo está repleto de pessoas terríveis”.

Vale conferir.

por Angela Debellis

 

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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