Como dito tantas vezes, em tempos nos quais as coisas parecem cada vez mais perecíveis e descartáveis, inovação é algo quase obrigatório. Mas, como é maravilhoso perceber que alguns clássicos sempre terão seu espaço garantido, mesmo que mais de um século tenha se passado desde o seu surgimento.
Em 1900, L. Frank Baum apresentava ao mundo o livro “O Mágico de Oz”, cuja terra fantástica serviu de palco para a grande aventura da jovem Dorothy (imortalizada, 39 anos depois, por Judy Garland, na premiada adaptação cinematográfica homônima dirigida por Victor Fleming).
Quando a narrativa já parecia totalmente estabelecida, com personagens assumindo posições fáceis de reconhecer, até mesmo em suas alcunhas – como A “Bruxa Boa do Norte” e “A Bruxa Má do Oeste” – em 1995, Gregory Maguire escreve “Wicked – The Life and Times of the Wicked Witch of the West” (que no Brasil ganhou o título “Wicked: A História Não Contada das Bruxas de Oz”) e traz uma nova perspectiva às icônicas Glinda e Elphaba.
A visão não canônica do autor alcança importância o suficiente para ser levada aos palcos, em 2003, transformando-se em uma das mais aclamadas produções da Broadway de todos os tempos. Ao conquistar uma sempre crescente legião de fãs, era questão de tempo até o cinema tornar-se a nova morada da impactante obra.
Essa releitura para as telonas é o que vemos em “Wicked” (Wicked – Parte I), que, sob a direção de Jon M. Chu, surge como um dos melhores filmes do ano, em todos os sentidos possíveis – o que pode ser algo óbvio àqueles que já conhecem o espetáculo teatral, mas também ganha ares de surpresa aos que punham em dúvida a capacidade do projeto se reinventar – sem que isso o fizesse perder sua essência.
A trama passada na Terra de Oz nos mostra duas jovens com vidas, trajetórias e comportamentos opostos, que terão seus caminhos cruzados inesperadamente e descobrirão que nem sempre nossas primeiras impressões sobre algo / alguém são corretas, havendo a necessidade de não nos esquecermos do quanto cada um de nós é complexo (mesmo quando, às vezes, nos fazemos parecer tão “comuns”).
Glinda (Ariana Grande) é a típica garota rica, que nunca teve uma preocupação genuína, a não ser com seu vasto guarda-roupa ou com as atitudes a serem tomadas para mantê-la no topo da popularidade. Enquanto Elphaba (Cynthia Erivo) precisou aprender, desde a infância (nessa fase vivida por Karis Musongole), a se defender de um mundo que a enxerga como uma pária, apenas por ter nascido com um tom de pele (verde) que não parece “aceitável” ou “normal” à grande maioria.
A improvável dupla se conhecerá nas dependências da Universidade Shiz, conhecida por formar feiticeiros, dirigida pela enigmática Madame Morrible (Michelle Yeoh) e um dos últimos lugares a contar com a atuação de animais falantes – como o carismático Professor Dillamond (voz de Peter Dinklage).
Contudo, a grandeza da renomada instituição não é suficiente para esconder que há algo de muito errado acontecendo nas redondezas. O que desperta ainda mais o interesse das jovens em conhecer aquele que, anos antes, trouxe de volta a esperança à população: O Maravilhoso Mágico de Oz (Jeff Goldblum).
O desejo de encontrar tal “salvador” na Cidade das Esmeraldas é algo que Glinda e Elphaba têm em comum, mas é o caminho permeado por outras importantes descobertas que dá forma ao roteiro de Winnie Holzman e Dana Fox. Assim como a impecável trilha sonora de Stephen Schwartz e John Powell, cujas canções ajudam a costurar os acontecimentos de maneira a conduzir o público em uma viagem regada a sorrisos, expectativas e lágrimas.
Tudo merece destaque no longa: da decisão por se criar cenários reais (com uso de CGI apenas em momentos necessários), à acertada escolha de elenco; da riqueza de detalhes dos figurinos (que contam sobre a personalidade de cada personagem), à preocupação em expandir o conteúdo, enquanto mantêm o respeito ao que já é consagrado há anos.
Com a conclusão da história prevista para estrear apenas em novembro de 2025, a primeira parte de “Wicked” consegue manter a qualidade de sua proposta por toda a duração de 160 minutos. O que faz com que, assim como Elphaba canta sobre seu futuro em “The Wizard and I”, o sucesso dessa produção e de sua vindoura sequência também seja ilimitado.
Imperdível.
por Angela Debellis
*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.
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