Crítica: “Entrevista com Deus”

Imagino que não chegue a ser surpresa para ninguém que um filme cujo título é “Entrevista com Deus” (Na Interview with God) tenha uma temática mais voltada ao público que seja religioso. Sendo assim, o público ao qual a produção se destina é bem específico, uma vez que a proposta não é oferecer uma narrativa de entretenimento puro e simples, mas levar às telas parte do conhecimento constante na Bíblia cristã.

A trama nos apresenta Paul Asher (Brenton Twaites), correspondente de guerra que retorna às atividades no jornal em que trabalha em Nova York, após ampla cobertura dos conflitos no Afeganistão. A volta à rotina também implicará no desenrolar de uma grave crise em seu casamento com Sarah (Yael Grobglas), devido a um fato que só será elucidado no decorrer do longa – e que me surpreendeu de maneira inesperada.

Nesse retorno, sem maiores explicações por parte do roteiro, ele firma contato de um homem (David Strathain) que afirma ser Deus e que oferece a ele a oportunidade de entrevistá-lo por três dias consecutivos, em sessões de 30 minutos. Tudo muito enigmático, mas com explicações aceitáveis no final das contas.

Obviamente não é das tarefas mais simples sentar-se diante de Deus – ou de quem afirma sê-Lo – e tecer uma lista de perguntas (apesar de ser quase certo que muitos daqueles que N’Ele creem, já se pegaram em algum momento pensando em várias coisas que gostariam de perguntar a Ele se tivessem tal oportunidade).

Paul acaba sendo levado por um caminho construído através das palavras de seu entrevistado, que consegue manter o jornalista sempre no centro dos diálogos, seja pela escolha dos lugares em que as conversas acontecem (e que têm a ver com situações passadas de sua vida) ou mesmo pelo fato de que Deus saberia exatamente os rumos que tudo tomaria – afinal, ele é onisciente.

É difícil julgar se a opção pela apresentação de Deus como um homem de aparência relativamente comum, trajando um terno, com voz tranquila e porte elegante foi a mais correta. Essa, talvez seja uma das maiores questões da humanidade que N’Ele crê: se fomos feitos à Sua semelhança e somos todos tão diferentes, qual seria a real aparência divina? Então, para simplificar, acredito que o que vemos no filme dirigido por Perry Lang, seja a representação da imagem de Deus como Paul acredita – o que acaba sendo um grande acerto, porque abre perspectiva para que cada um tenha sua própria versão mais pessoal.

Apesar do roteiro escrito por Ken Aguado contar com grande parte do texto advindo de trechos bíblicos e todas as várias interpretações que estes podem ter, também há espaço para que enxerguemos a tal entrevista como uma conversa franca entre amigos de muito tempo. Há sinceridade plena – ainda que esta possa parecer cruel em determinados momentos – e uma proximidade que só é possível entre aqueles que têm a confiança como base das relações.

Com um ritmo lento e quase nenhum uso de trilha sonora, o filme pode parecer excessivamente reflexivo em alguns momentos, mas sua mediana duração (97 minutos) e as dúvidas principais que são sanadas apenas em pontos-chave da narrativa ajudam a segurar a atenção dos espectadores.

Ainda que todos tenhamos livre-arbítrio (sim, ele é citado algumas vezes durante a exibição), inclusive para escolher o que assistir no cinema, creio que apenas os que já têm a religião como fator de importância em suas vidas conseguirão tirar proveito da tal experiência cinematográfica.

Vale ressaltar que a produtora responsável pela obra não tem fins lucrativos e renda obtida nas bilheterias será revertida a instituições de caridade que auxiliam crianças.

por Angela Debellis

Publicado originalmente no site A Toupeira.

Comments are closed.