Uma seção erma e empoeirada em uma pequena biblioteca em Crozon, na Bretanha, que serve de abrigo a centenas de manuscritos rejeitados, que nunca tiveram a chance de serem apreciados por nenhum leitor.
É nesse inusitado cenário que a editora junior Daphné Despero (Alice Isaaz) descobre uma espécie de joia literária perdida entre títulos de gosto duvidoso, como o que trata da falta de menstruação em bonecas infláveis.
A obra é um romance supostamente escrito pelo pizzaiolo local, que, segundo a viúva Madeleine (Josiane Stoléru) e a filha única do casal, Joséphine (Camille Cottin), jamais mostrou nenhuma aptidão ou mesmo interesse para a escrita – mas, que, graças ao conteúdo encontrado por Daphné, torna-se um dos autores mais festejados da atualidade em todo território francês.
Esse é “O Mistério de Henri Pick” (Le Mystère Henri Pick), comédia franco belga com pinceladas de suspense investigativo, que consegue prender a atenção do público graças a uma trama bem desenvolvida desde o início e que, quando parece ter tudo resolvido, ganha novo fôlego para apresentar mais uma interessante reviravolta.
Se parece fácil aceitar a ascensão do humilde Henri (ou de sua memória) como um profissional nato da escrita, também é simples entender os motivos que levam o crítico Jean-Michel Roucche (Fabrice Luchini) a duvidar dela. Com anos de experiência no mercado de análises de livros e à frente de seu próprio programa sobre o tema, ele não demonstra nenhum pudor em explanar sua desconfiança e começa uma busca cega – e por vezes bastante divertida – pelo verdadeiro autor do romance.
Ainda que pareça algo que beira a crueldade desnecessária – já que a família do suposto escritor se sente acalentada por esse fato inesperado em suas vidas, não deixa de ser louvável sua determinação em achar uma suposta verdade que poderia lhe dar de volta a credibilidade e o emprego perdidos.
O mais interessante do longa dirigido por Rémi Bezançon é sua capacidade de convencimento. Através de pequenos detalhes, conseguimos enxergar coerência em um quebra-cabeças, para, minutos depois perceber que nem todas as peças se encaixavam como deveriam.
E uma nova pista é lançada para formar outra narrativa que nos pareça correta, então, fica a dica de prestar atenção em tudo e todos, mesmo que não pareçam relevantes em um primeiro momento.
Para quem gosta de produções com esse viés detetivesco – ainda que não seja de fato o ponto mais importante – e comédias inteligentes, é uma boa e surpreendente pedida.
por Angela Debellis
Texto originalmente publicado no site A Toupeira.
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