Muito antes dos chamados “influenciadores digitais” surgirem como figuras de destaque e vasto alcance de público no mercado, houve Hebe Camargo. Uma mulher que, em plenos anos de 1980 alcançou o ápice de sua popularidade e escreveu seu nome em meio a uma sociedade que sofria com a censura, a repressão e o preconceito – elementos que ainda se sobrepõem a tantas vozes, em pleno século XXI.
Em “Hebe – A Estrela do Brasil” vemos a protagonista interpretada por Andréa Beltrão já com sua carreira consolidada através do bem-sucedido programa semanal apresentado no canal Bandeirantes. Mas, se na frente das câmeras o que se destacavam eram os figurinos luxuosos e a risada contagiante, nos bastidores as coisas nem sempre eram tão glamourosas assim.
E é essa dualidade que o trabalho do diretor Maurício Farias consegue entregar ao público: a estrela mais popular da televisão também era uma mulher que sofria com o ciúme excessivo e a violência do marido Lélio Ravagnani (Marco Ricca). A artista que punha tantos sorrisos nos rostos de sua plateia com pautas atraentes e divertidas, era a mesma que se indignava com a fria postura da igreja católica diante da morte de seu cabeleireiro e amigo pessoal, “Carlucho” (Ivo Müller) vítima do HIV – que ainda não era tão amplamente discutido e do qual pouco se sabia fora das esferas da medicina.
Há vários momentos de destaque: do pedido de demissão ao vivo da Bandeirantes – após um comovente discurso sobre caráter – à estreia no SBT (canal em que ficaria por 25 anos); do encontro emocionado com seu ídolo / amigo Roberto Carlos, ao programa que contou, ao mesmo tempo, com as presenças de Roberta Close e Dercy Gonçalves; do real risco de prisão por descumprimento de limitações do órgão censor à coragem de falar abertamente sobre política, em um momento em que a corrupção acontecia a olhos vistos.
Em uma decisão bastante acertada, a maior preocupação do filme foi trazer às telas a essência de cada personagem, ainda que nem sempre quem dá vida a ele tenha uma aparência muito similar ao retratado. A própria Andréa Beltrão cativa a plateia ao não exagerar nos trejeitos e ainda assim conseguir – através da nostalgia da maioria – encontrar, como ela mesma disse em entrevista concedida na Coletiva de Imprensa que aconteceu na capital paulista, “a sua própria Hebe”.
Para quem, como eu, viveu essa época, foi muito bom relembrar o quanto acompanhar o programa todas as semanas era quase um “evento em família”, quando adultos e crianças se reuniam em frente à TV (muitas vezes na casa de algum vizinho) para assistir às entrevistas concedidas no sofá que era a peça fundamental do cenário.
Assim como foi gratificante perceber a clara preocupação com detalhes – positivos ou não – que remetem diretamente à década de 1980, como a abertura da narrativa com uma excêntrica participação do grupo Menudo; o visual que ultrapassava o limite do exagero, mas que fez desse período um dos mais marcantes; o (sempre condenável, porém aceitável nesse tempo) hábito dos convidados fumarem no estúdio durante a gravação. Uma verdadeira viagem no tempo.
Vale conferir.
por Angela Debellis
*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.
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