Crítica: “Um Filho”

Tem se tornado corrente a sensação de vivermos em um mundo abarrotado de relações –frágeis como uma bolha de sabão. O “Até que a morte nos separe” parece ter perdido de vez seu espaço para o “Que seja eterno enquanto dure”.

Continua sendo difícil acreditar que alguém se case já cogitando a possibilidade de, em algum momento futuro, separar-se. Mas, às vezes, acontece, e há de se conseguir seguir em frente, apesar de tudo. O agravante é quando mais pessoas acabam envolvidas na decisão dos cônjuges, em especial se isso diz respeito a filhos.

Inspirado na peça de teatro francesa, “Le Fils” – lançada em 2018, “Um Filho” (The Son) é o segundo capítulo da trilogia cinematográfica iniciada em 2020 por “Meu Pai”. O roteiro de Florian Zeller (também à frente da direção) e Christopher Hampton traz à luz os desdobramentos por trás do divórcio de Peter (Hugh Jackman, em interpretação arrebatadora) e Kate (Laura Dern), que, tornam-se um ex-casal, mas seguem tendo obrigações em comum, graças a seu filho único, Nicholas (Zen Mc Grath).

Dois anos após a separação, Peter mantém o relacionamento com sua parceira, Beth (Vanessa Kirby), com quem tem um filho pequeno, Theo (Felix Goddard / Max Goddard). A constituição de uma nova família – assim como a obsessão por seu trabalho – faz com que acabe não apenas se distanciando de seu primogênito, mas sendo omisso em relação às suas responsabilidades de pai.

Tal fato é colocado em xeque quando sua ex-esposa Kate revela que o garoto não tem frequentado as aulas e apresentado um preocupante comportamento, que transita entre o distante e o agressivo.

Nicholas, então, pede para morar com o pai, sua madrasta e seu irmão caçula, o que acaba, em curto prazo, mostrando-se uma ideia equivocada, mas não pelos motivos que poderiam parecer mais óbvios.

“Um Filho” é o típico filme feito de momentos, sejam bons ou ruins. Entre os destaques positivos, a cena envolvendo o reencontro de Peter e seu pai, Anthony (Anthony Hopkins, reprisando o papel que lhe rendeu o Oscar em 2021), quando duras verdades são ditas e feridas do passado reabertas. Além da impactante e pungente conclusão do drama, que consegue, em seus instantes derradeiros, arrancar todas as lágrimas que o restante da produção tem certa dificuldade em conseguir.

Por outro lado, há um nítido problema de atuação que impede que o público se conecte com a dimensão que deveria / poderia com o personagem que dá título ao longa. Talvez tenha sido uma responsabilidade exagerada sobre os ombros de um ator com pouca experiência nas telas, mas isso influencia – e muito – na experiência proporcionada.

Cabe ainda destacar a sutileza de vários detalhes em cena – que nos levam a perceber como alguns importantes fatos serão desenrolados, assim como a grande sabedoria em retratar três momentos distintos da vida, através de simples janelas nos quartos. Além, é claro do sempre bem-vindo trabalho de Hans Zimmer na trilha sonora.

Vale conferir.

por Angela Debellis

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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