Crítica: “A Pequena Sereia”

“A Pequena Sereia” (The Little Mermaid) é, sem dúvidas, um dos maiores clássicos de animação da Disney. Com canções memoráveis e uma história que hoje pode ser considerada controversa, era de se esperar que, após uma sucessão de adaptações em live action, este seria um dos títulos escolhidos para ganhar uma versão com atores e atrizes de verdade.

O desafio não é fácil, ainda mais adaptar sereias e sereianos ao lado de humanos e criaturas marinhas que falam. E o resultado final acabou sendo, assim como as últimas adaptações live action do estúdio, mediano.

Dirigida por Rob Marshall, a produção traz à vida a pequena sereia Ariel (interpretada pela cantora e atriz Halle Bailey), filha de Rei dos Mares Tritão (Javier Bardem), que anseia viver juntos aos seres humanos e desfrutar das maravilhas de suas culturas como dançar e amar.

Mas, há uma questão importante – seres marinhos não vivem juntos aos humanos, e o Rei Tritão proíbe qualquer tipo de contato com o povo da superfície. Mesmo com os conselhos de Linguado (voz de Jacob Tremblay) e Sebastião (voz de Daveed Diggs), Ariel decide fazer um pacto com a bruxa dos mares Úrsula (Melissa McCarthy) perdendo seu maior dom – o canto da sereia – em troca de viver sobre a terra.

Impossível não notar as mudanças pontuais entre o roteiro da animação e do filme. Enquanto no longa animado de 1989, Ariel poderia ser vista apenas por alguns, como uma jovem submissa e obcecada por um príncipe, nesta adaptação a narrativa foca nas qualidades da humanidade observadas pela sereia e pela bondade do Príncipe Eric (Jonah Hauer-King).

Além disto, vemos mais da família de Eric (que na animação é adotado), suas motivações por viagens marítimas e sua benevolência com o povo. No mar, acompanhamos a preocupação do pai de Ariel, principalmente pela perda de sua esposa causada pelos humanos, dando a motivação do personagem para a explosiva necessidade de impedir que seus semelhantes tenham contato com os habitantes da superfície.

Assim, a obra deixa de lado o passado obscuro da animação e entrega uma trama em partes cativante e com boas atuações, ainda que sem verdadeira graça ou qualquer objetivo interessante. Halle Bailey, que simplesmente brilha em todas as cenas nos momentos de canção, infelizmente parece fazer o mínimo na hora da atuação, em especial após perder sua voz.

Quanto aos coadjuvantes, Linguado é deixado tanto de lado ao longo do filme, que dá a sensação de ser proposital, devido ao seu design. Por outro lado, Sebastião desempenha um papel gigantesco em todo o enredo, sendo cômico e sagaz em grandes momentos, junto, é claro, claro de Sabidão (voz de Awkwafina), a ave amiga dos protagonistas.

Mas, quem de fato rouba a cena quando tem oportunidade é Melissa McCarthy. Trazendo o mesmo ar sarcástico da animação, sua Úrsula tem motivações mais complexas e profundas, além de apresentar parentesco com o Rei Tritão, deixando sua jornada por poder muito mais trabalhada.

Se a canção principal “Part of your World” é a cereja do bolo, também vale dizer que o filme tem problemas em seu design de produção, figurino e efeitos especiais, mas que poderiam ser ignorados se a história fosse minimamente mais envolvente. Entre as coisas que incomodam, há a falta de uma elaboração maior para o reino dos mares (como visto como na animação), ou até mesmo o fato de Ariel andando conseguir ser mais rápida do que Sabidão voando.

“A Pequena Sereia” traz consigo um trabalho árduo de diversidade e aprofundamento no material original, mas peca ao contar com a mesma fórmula já vista antes, onde o fim mágico parece ser a solução para um roteiro que poderia render muito mais.

por Artur Francisco

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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