Crítica: “Wonka”

Uma memória muito feliz de minha infância é a de estar sentada em frente à televisão, após a escola, esperando pelo filme do dia a ser exibido na Sessão da Tarde. E o quanto era especial quando o locutor anunciava “A Fantástica Fábrica de Chocolate”.

Muitos anos e um remake depois, eis que me vi ansiosa pelo reencontro com um de meus personagens literários favoritos, ao entrar na sala de cinema para assistir a “Wonka”. Se havia algum temor em acompanhar algo totalmente novo, este foi dissipado por completo, logo no primeiro vislumbre do que seria apresentado em tela. Era o momento de embarcar em uma nova e açucarada aventura.

No longa dirigido por Paul King (que também escreve o roteiro junto a Simon Farnaby, repetindo a parceria excepcional, responsável pelo lindo “Paddington 2”), vemos Willy Wonka (Thimothée Chalamet, ganhando meu coração) bem antes dos eventos mostrados no livro escrito em 1964 por Roald Dahl, que originou o filme clássico de 1971 estrelado por Gene Wilder, e o remake de 2005 – com Johnny Depp no papel principal.

O jovem chocolateiro (com ares de mágico amador) tem em sua bagagem poucos itens materiais, mas um universo de sonhos e esperanças. Entre seus desejos, o maior é abrir uma loja própria, para vender suas criações originais e cheias de encantamento, tal qual ambicionado desde garoto, quando vivia uma realidade humilde, mas repleta de amor, ao lado de sua mãe (interpretada por Sally Hawkins).

O cenário no qual a trama se passa remete a uma cidade europeia nos idos de 1940, onde há um espaço conhecido como Galeria Gourmet, onde três ambiciosos magnatas do ramo do chocolate – Slugworth, Fickelgruber e Prodnose (Paterson Joseph, Mathew Baynton e Matt Lucas, respectivamente) – dominam por completo o mercado local.

Tal controle dos empresários se dá através da providencial ajuda de outras poderosas instituições: o departamento de polícia (que tem à frente o personagem interpretado por Keegan-Michael Key) e a igreja (representada pelo Padre Julius, papel de Rowan Atkinson).

Além da dura (entenda-se desleal) concorrência, o protagonista precisará enfrentar um dos maiores perigos do mundo: a desonestidade humana – tão bem representada na figura de Alva (Olivia Colman), dona de uma lavanderia / estalagem que, ao lado de seu funcionário Escovão (Tom Davis), condena Willy a um inesperado encarceramento que pode colocar seus objetivos em um risco ainda maior.

Se por um lado, as coisas parecem tão desfavoráveis, por outro, existe a constante sensação de que tudo vai dar certo. Trilhando essa jornada ao lado do querido chocolateiro, está Noodle (Calah Lane), jovem órfã que, mesmo conhecendo apenas o lado triste e sem perspectiva da vida, parece ter um brilho inato, que nenhuma maldade alheia é capaz de apagar.

Por mais que pareça difícil de acreditar, nem todo adulto é ruim. A prova é o quarteto formado pelo contador Ábaco Crunch (Jim Carter), a telefonista Lota Trim (Rakhee Thakrar), a encanadora Piper Benz (Natasha Rothwell) e o comediante Larry Risadinha (Rich Fulcher), que serão fundamentais para dar à história o toque preciso de simpatia e esperança.

Não sentindo culpa em usar o trocadilho, em minha opinião, “Wonka” é o filme mais doce do ano, no melhor sentido. Visualmente deslumbrante, com figurinos impecáveis e personagens que conquistam facilmente o espectador, a produção é sublime. Faz jus ao material original e dá a ele uma inédita profundidade, inclusive, deixando margem para outro capítulo posterior, quem sabe?

E, é claro que não há como se falar de Wonka, sem associá-lo aos extraordinários Oompa-Loompas. Dessa vez, apenas um simpático homenzinho laranja de cabelos verdes (vivido por Hugh Grant, no que pode ser considerado um de seus trabalhos mais bacanas) tem participação ativa, mas seus momentos em cena são impagáveis.

Para fechar, cabe o destaque ao trabalho do compositor Joby Talbot, que cria uma trilha sonora original, formada por canções que capturam – com delicadeza – a essência da narrativa, emocionando e divertindo na medida certa – assim como as faixas da primeira adaptação cinematográfica.

Não sou mais criança, nem encontrei meu ticket dourado em uma barra de chocolate. Mas, sigo levando o ensinamento de Willy Wonka no coração: “Não há nada melhor que viver em plena fantasia… E feliz há de ser, quem quiser assim viver…”.

Imperdível.

por Angela Debellis

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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