Crítica: Mulher-Maravilha 1984

Em uma definição simples, herói é aquele que nos serve de inspiração por sua coragem e altruísmo. É quem se baseia em princípios morais para agir, tendo sabedoria e discernimento para se colocar à disposição dos menos afortunados que precisam de sua ajuda. É aquele cuja humildade é tão grande quanto a bravura e que nos faz acreditar na prevalência da justiça e do bem.

“Mulher-Maravilha 1984” (Wonder Woman 1984) é sobre isso. É sobre o retrato da heroína que inspira gerações há quase oito décadas (sua primeira aparição nos quadrinhos da DC Comics foi em 1941), e que, nesse ano tão triste e complicado que o mundo vivencia, chega para falar sobre a importância da empatia e sobre a necessidade de se olhar para além de nossos interesses pessoais – que muitas vezes, sem que nem ao menos tenhamos conciência, ultrapassam a tênue linha do que é certo e do que é apenas mesquinho.

No segundo filme da agora franquia, Diana Prince (Gal Gadot) leva uma vida aparentemente confortável, com reconhecimento em um emprego estável no Instituto Smithsonian. Ao mesmo tempo, segue sua jornada solitária como Mulher-Maravilha, lutando para manter sua identidade o mais secreta possível – coisa que na década de 1980 não era tão difícil, já que ainda faltariam anos para a febre dos celulares com câmeras cada vez mais acessíveis e potentes.

Os antagonistas da história são figuras tão distintas quanto improváveis: Maxwell Lord (Pedro Pascal) é um micro-empresário do ramo de petróleo, com grandes sonhos e poucas realizações; Doutora Bárbara Minerva (Kristen Wiig) – que mais tarde viria a se tornar a Mulher-Leopardo / Cheetah – é uma especialista em várias áreas (em destaque, a gemologia), cuja inteligência é tão grande quanto sua “invisibilidade” social. Em comum, o desejo pelo sucesso e aceitação.

Com o inesperado (mas eficazmente explicado) retorno de Steve Trevor, o longa que tem nas cenas de ação e efeitos especiais grandes trunfos a serem exaltados, ganha quando o assunto é proximidade com o público. O olhar de encantamento pelo qual o personagem enxerga as maravilhas do mundo atual – no caso, em 1984 – consegue ser comovente e divertido ao mesmo tempo e rende cenas memoráveis. Assim como a retomada de seu relacionamento com Diana, a quem segue apoiando de maneira exemplar.

Por falar em ação, a sequência inicial passada na Ilha de Temíscira, com a protagonista ainda criança (nessa fase vivida mais uma vez por Lilly Aspell), é de uma qualidade imensa e serve como incentivo para que a produção seja vista na maior tela possível, a fim de que se possa acompanhar cada detalhe visual e sonoro que é oferecido à plateia – obviamente, seguindo todos os protocolos de segurança e higiene necessários para que nos mantenhamos saudáveis antes, durante e após a sessão.

Tudo funciona em harmonia. A cenografia que recria a incomparável década de 1980, que até hoje é celebrada por elementos icônicos seja na música, na moda ou no estilo de vida. As referências a grandes momentos dos quadrinhos. A emoção que provoca a trilha sonora criada por Hans Zimmer. O heroísmo e a vilania representados com precisão e tornando natural o questionamento sobre até que ponto algo pode ser considerado certo ou errado, quando descobrimos mais detalhes.

Tais pensamentos dos espectadores são resultado de excelentes atuações de todo o elenco que, junto a uma narrativa sem falhas, conseguem manter em alta o interesse do público por 2 horas e meia de duração – período no qual dá para se empolgar, rir e chorar com a mesma facilidade.

Por trás das câmeras, a grande estrela continua sendo Patty Jenkins. A diretora (também responsável pelo roteiro junto a Geoff Johns) entrega, mais uma vez, um trabalho primoroso e ratifica que é o nome perfeito para seguir no comando da saga da Princesa Amazona nas telas, em todas as produções futuras que forem realizadas.

Com sua data de estreia adiada inúmeras vezes, “Mulher-Maravilha 1984” terá a inusitada missão de chegar aos cinemas e ao streaming simultaneamente (pelo menos nos Estados Unidos). E, embora tenha sido concebido bem antes da pandemia de Covid-19 que ainda assola o planeta, ao término da exibição promove a oportuna sensação de que sua história é como um necessário alento para que continuemos em frente, alimentando o herói que temos dentro de cada um de nós.

Totalmente imperdível.

Observação: Há uma cena pós-créditos que segue inédita até a data de estreia nos cinemas, pois não foi exibida nas sessões para os jornalistas.

por Angela Debellis

*Texto originalmente publicado no site A Toupeira.

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